quinta-feira, 24 de abril de 2014

Seja um agente e não um papagaio

Algumas coisas sempre causam-me surpresa em Coimbra. Uma delas é o cuidado com as crianças que realmente me faz pensar no sentido de comunidade, que é diferente do que eu experimentava.

Eu gosto de deixar as crianças o mais a vontade possível, por isso, é comum eles andarem um pouco afastado de nós e, aqui, já andam sozinhas de ônibus e voltam para casa a pé. O que me dá a oportunidade de vivenciar algumas situações interessantes.

Um dia, com o mais velho a andar de skate a minha frente, uma senhora vendedora de flores em frente a igreja que frequentamos fala para ele ter cuidado para não ir até a rua porque passa muito carro. Ao passar por ela, ouço o comentário de sua amiga que estava perto:

- O miúdo está sozinho?

- Não, deixe estar, o pai dele é esse aí, eles moram cá embaixo.

Além de perceber a preocupação em saber se ele estava sozinho, o que pode ser normal, a senhora, que nunca conversei com ela, sabia que eu era o seu pai, onde morávamos e, mesmo assim, mesmo eu por perto, viu-se no direito de falar para o Bernardo tomar cuidado.

As conversas com eles são muito frequentes. Quando estamos separados no ônibus e alguém senta-se ao lado, é comum ver a pessoa puxar a conversa somente para ver se estão sozinhos.

Com a minha pequena as coisas são mais diretas. Como ela é a menor, ainda tem um jeitão de criança e os cabelos loiros e cacheados, vejo que cativa toda a gente. Hoje, ao entrarmos no ônibus que pegamos todas as manhãs, as senhoras que estavam presentes quase que disputaram para ficar com a Vivi no colo, rs... É muito engraçado de ver e gratificante de saber de um local que cuida da infância.


A experiência que estamos vivendo deixa-me, cada vez mais, pensando que para o pessoal de cá, o problema não é só da pessoa mas da comunidade. Algo parecido presenciei quando estive nos EUA, mas neste caso, no "mundo adulto." O sentido de comunidade é muito forte.

Isso fez-me pensar muito naquilo que vemos para copa. Ontem vi que a Adidas foi repreendida pelo Ministério do Turismo por lançar camisetas e produtos para a copa dentro de uma perspectiva da exploração sexual e da visão que no Brasil é só sexo.

Pensei muito em nossas crianças pois conhecemos como a exploração infantil é enorme. Ao mesmo tempo fiquei a imaginar se os mesmos indivíduos que estão "gritando" para o falhanço da copa, estão comprometidas com a proteção de nossa sociedade e nossas crianças. Vários grupos de apoio e uma rede grande de pessoas ligadas ao Governo e Associações estão preocupadas com essa variante para a copa e, seguramente, precisam de apoio para conseguir proteger a nossa infância da exploração sexual. Logicamente o ótimo é existir essa proteção durante o tempo todo, mas tendo o do agora, já é um começo.

A minha conclusão, longe de ser totalmente errada, é que não! As pessoas estão muito mais preocupadas com o FB e a ação pontual que a construção e a comunidade. A primeira é rápida e não faz parte da vida, a segunda, é demorada, suada, sofrida e leva a ação para o nosso cotidiano e para dentro de nossa casa.

Pelo que parece, a "preocupação" para difundir o pensamento contra a copa, está fincados no terreno das universidades e juventude. É o mesmo terreno daqueles que frequentam as Universidades Públicas, Serviços Públicos e, portanto, diferentes da grande maioria da população. São as pessoas que a militância não alcança nem o correio eletrônico e a revolta não ultrapassa o Facebook. É a mesma classe que, por exemplo, buscam os melhores preços na feirinha dos importados, as trabalhadoras domésticas sem carteira assinada, a babá que volta para casa somente no domingo para cuidar de sua própria filha, pergunta a diferença de preço do serviço com Nota Fiscal e sem Nota Fiscal e busca a melhor festa para seus filhos, dentro de um orçamento que não se importam ter o trabalho infantil envolvido.

A visão de mundo dessas pessoas é a mesma: o problema é dos outros. O mesmo raciocínio que justifica a falação que o Governo está todo errado pauta  o pensamento que posso fazer tudo para gastar menos.

E, também, é o mesmo raciocínio que leva a ficar na internet postando coisas contra a copa e o trabalho infantil, mas alheio ao fato que são replicadores das mazelas que julgam combater pela "rede". Para essas, o que faz sentido é ficar no Facebook, no twitter e outros meios, sair à rua no dia marcado, tirar fotos pelo Instagram, "protestar" aos plenos pulmões e voltar para casa para postar no FB o que todos falaram. E negar qualquer apoio a associações e grupos que possuem algum projeto de mudança social. Esses são os papagaios que repetem o que ouvem mas sem qualquer entendimento do que se trata e, muito mais, do seu conteúdo.

Por outro lado, as pessoas que sabem que o governo é o retrato de nossas ações, estão engajadas em grupos e associações que tentam mudar alguma realidade. Seguramente essas pessoas usam a net e saem a rua, mas com muitos menos pessoas e interessados. Tomo a liberdade de afirmar que muitas destas, não possuem nem tempo para ficarem discutindo a copa pq, no fundo, como agem sobre propostas concretas, não conseguem nem entender o que se passa com o pessimismo geral sobre o momento brasileiro.

Para essa copa, realmente lute pela nossa sociedade, seja um agente, engaje-se em algo produtivo como, por exemplo, os trabalhos para proteger nossas crianças da exploração sexual. Não seja o papagaio que repete o que houve, o podle ensinado que replica suas ações ou o irresponsável que reclama o tempo todo, mas quando ganha a atenção e lhe perguntam: Então! Você falou que está tudo errado, mas o que vc está fazendo para melhorar?

- Hummm, não sei!Estou no FB replicando o que meus amigos postam.

Assim como não existe o tudo como ótimo, não há o tudo como péssimo. 

Abraço!

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